Traições invisíveis (Maternidade Invisível 8)
Monogamia é uma forma de cárcere privado voluntário, a que muitos ainda se submetem em países judaico-cristãos, em nome da preservação do patrimônio familiar. Corrijo, um cárcere a que muitas se submetem, pois os homens que permanecem dentro dele dia e noite são estatisticamente raros. Deve ser ainda mais sufocante ficar num cárcere privado monogâmico quando a mulher está grávida ou puérpera, afinal os companheiros de três amigas minhas nessas condições não cumpriram sua pena. Nunca ouvi uma história sequer de uma mãe de bebê que traiu o pai durante a gravidez ou enquanto cuidava do filho.
Três amigas traídas durante seus períodos de dedicação física e emocional máxima, para uma pessoa de poucas amigas como eu, significa muito. Ainda mais porque dificilmente a mulher traída tem coragem de compartilhar seu fardo e sofrimento com outras mulheres, principalmente quando a traição não foi sucedida de separação. A mulher, a mãe, traída sente vergonha por se sentir desmerecida pela pessoa que mais lhe jurava amar e ser fiel, por se sentir inferior perante as amigas que nunca (souberam ou confessaram que) foram traídas e por medo de ser considerada tola e fraca por permanecer no relacionamento apesar de tudo. A mulher mãe traída tem medo de que sintam pena dela.
A primeira amiga descobriu pela boca do próprio pai, porque ainda não tinha se tornado mãe e consequentemente se importava bastante com o comportamento e fidelidade do marido, que ela já sabia ser sexualmente infiel. As outras duas já eram mães, muito mais preocupadas com suas crianças do que com seus próprios egos e maridos, descobrindo o delito casualmente: uma encontrou solicitação de teste de parentalidade e a outra dois testes de sangue para doenças sexualmente transmissíveis. Ambas correram ou ainda correm risco de contrair doenças venéreas pela infidelidade, mentira e irresponsabilidade de seus maridos que não se prestaram nem para usar camisinha.
A amiga que descobriu mais precocemente estava no fim da gravidez quando soube que o pai da sua criança soube que seria pai de outra criança. Ela chegou a ligar, grávida, para a futura mãe da outra criança filha do pai da criança dela, informando que ele era casado e estava esperando uma (outra) criança dela, o que levou a outra futura mãe a desistir de ter a criança.
Já outra amiga traída descobriu muito mais tarde que o pai de suas duas crianças também tinha engravidado outra futura mãe de duas crianças ao mesmo tempo que ela, perdendo a oportunidade de informar à outra futura mãe, ou ser informada por ela, de que o pai em comum já se encontrava em processo de manutenção de uma família com ela(s).
A terceira amiga traída descobriu antes, quer dizer depois: antes de ter dois filhos, mas depois da gravidez, que tinha sido traída, sem, no entanto, precisar informar ou ser informada por outra mãe ou futura mãe, pois afinal o affair que durou quase um ano tinha sido com outro homem. Quer dizer, se tivesse sido com outra mulher fértil, o desfecho possivelmente teria sido o mesmo das mães paralelas de crianças de pai em comum.
A primeira mãe permaneceu casada os primeiros meses de vida de sua criança, até que se separou quando ele a responsabilizou pelo sentimento de culpa carregava pela desistência da existência da criança que teria tido com a outra (ex-futura) mãe. Após mandá-lo embora da casa que era só dela, atirou todas as roupas do futuro ex-marido pela janela. As outras duas têm quase inveja de não terem tido a mesma coragem, mesmo tendo ouvido igualmente de seus maridos que elas os fazem se sentirem culpados por suas irresponsabilidades.
Final das histórias: nenhum dos pais traidores jamais se desculpou, pra nenhuma das mães que traíram, nem pra crianças que geraram e deixaram de gerar. Apenas um deles reconheceu que aquilo que tinha feito seria considerado por outra pessoas, caso viessem a saber do fato, já que as mães traídas não contam essas coisas pra ninguém, muito menos traidores, como algo “moralmente condenável”. A essas palavras minha amiga se segurou com toda força como se significassem “eu te imploro perdão por te mentir, sacanear e fazer sofrer, ainda mais enquanto cuidavas de nosso bebê, juro que não vou mais te machucar”, decidindo por não se separar de homem tão maduro, sensível e responsável como seu marido.
Minha avó já dizia sobre meu avô “ele pode ter outras, mas eu é que levo seu sobrenome”. Ainda assim, morria de medo de que aparecessem outros herdeiros no funeral dele. Não apareceu ninguém. Minha avó pode gozar de seu direito a metade do patrimônio familiar total do pai de seus filhos até a sua morte.