Perfazendo a perfeição
A perfeição é linda. Desabrochando em forma de flor, de alvorada, de uma canção, desejamos morar naquele momento para sempre. Deslizamos pela pétala branca cintilante de uma orquídea; caminhamos pelas nuvens refletindo infindáveis nuances do sol; mergulhamos nas cordas rangentes de um violoncelo. Cada nova mirada de uma mesma pintura é redescoberta que revela relevos da tinta a óleo, pinceladas finas sobrepondo gestos bruscos. A perfeição só é linda por não se exaurir jamais; quem constantemente a perfaz é a imperfeição.
A perfeição é imperfeita. Ela requer a sua e a minha própria incompletude para completar-se. Como num passe de mágica, pequenos gestos bruscos visíveis com uma lupa tornam-se, sobre um quadro do tamanho de uma parede, detalhes de delicadeza. Aqueles erros, equívocos, imperfeições, nada mais eram que gritos do instinto pela perfeição, sabendo que ela só se manifesta ao escutar nossos urros. Sem urro, ela não é verdadeira.
A perfeição é verdade. Mas a verdade não é perfeita. Seus percalços a fazem vulnerável e, por isso mesmo, única. A minha verdade é só minha, mas pode coincidir com a tua, criando fogos de artifício; explosões de um encontro inesperado. Tanto o atrito de nossas diferenças, imperfeições e fragilidades, quanto a harmonia de seu encontro, enriquecem nossas verdades. Torno-me mais por conhecer tua verdade; aperfeiçoo-me através de nossas diferenças; deleito-me com as consonâncias e dissonâncias dos acordes que juntos formamos.
A perfeição assusta: nunca é o que esperamos. Se fosse, não haveria deleite; tão somente conforto. Suas surpresas às vezes doem, evocam memórias de antigas perfeições que se revelaram imperfeitas, e rasgam o peito. Ilusões de que a perfeição existe e dura para sempre. Ilusões de saber o que é a perfeição, onde ela fica, e de que um dia moraremos lá em paz.
A perfeição traz paz. No momento em que abraço suas imperfeições, e com ela as minhas próprias, todo lugar é o seu e o meu lugar. Todo lugar é permeado pela perfeição, pois eu sei que ela é que mora em meu próprio lar.
Poetinha aniversariante!