Grãos de alegria

“Alegria!” anunciou cedinho, no dia do próprio aniversário. Com a mesma alegria me contagiou desde a barriga. Vir à luz e abandonar para sempre aquele lugar só nosso, tão quentinho, nutrido e seguro, não foi chocante. Se chorei, foi por breve instante, pois logo me deparei com a beleza; a beleza do rosto, do sorriso e da alegria dela. Ao longo dos anos ela me ensinaria a enxergar a mesma beleza em cada canto do mundo pelo qual eu passasse.

Aquela bela alegria não seria tão contagiante se não fosse verdadeira. Um sorriso que não vem do fundo de uma alma ferida é simpático, mas pouco viveu. Como uma larva que precisa romper o casulo sozinha para dar vigor às suas asas de borboleta, um sorriso que se regenera a cada dor traz consigo mais vida e amor – e humor.

Humor que lembra que tudo é passageiro. Uma risada tão autêntica que aperta o abdômen o massageia dos sustos e pontapés que tomou, dos sapos que engoliu, das rejeições que desceram pela goela. Ironias, piadas, trocadilhos brotam pelo simples prazer de unir o inesperado, de dar sentido novo a um caos sem sentido – arte.

Arte. Expressar, espremer o fundo da alma vertendo vermelhos vibrantes, marrons recônditos, pinceladas que primeiro revelam um oceano escondido para depois velá-lo com traços suaves da maturidade. Alma mater.

Alma materna, alma de mãe, alma de ser humano que é grande, que sofre, que transforma, que amadurece, que se protege e protege o outro – mas não em redoma de vidro. Protege ao nutrir.

Protege ao jogar as sementes no jardim e regá-las quando a chuva estia. Protege olhando seu crescimento pela janela, dando chance às flores de espiarem-na pela mesma janela como em um espelho, repletas de admiração. Retira-lhes as folhas secas, poda as verdes, provê sombra no sol do verão. Um solo bem nutrido floresce com a força de uma floresta.

Grãos de amor semeiam alegria e brotam gratidão.