Os 5 sentidos da vida

 In essays, self-improvement

 

Conscientes ou não, nós todos buscamos o sentido da vida. Ou ela faz sentido e dispensa explicações, ou apresenta lacunas de tamanhos variados que tentamos preencher de diversas formas. No primeiro caso, se estivéssemos na floresta, estaríamos ocupados caçando uma capivara ou um javali para manter a sobrevivência. No segundo caso, sairíamos no bosque caçando borboletas, experimentando diversas formas de tapar os vazios que a fome saciada deixa. Só que as borboletas que capturamos voam; e às vezes nem são borboletas, mas morcegos. Qual é, então, o sentido certo, certeiro, 100% garantido, da vida?

O sentido da vida pode ir para cima, como pode ir para baixo: atinge-se sucesso profissional; cai-se na sarjeta. O sentido da vida também pode ir para direita ou para a esquerda: encontra-se o amor da vida; ou um mau-caráter e uma desilusão amorosa. Transversalidades estão na moda, pois misturam um pouco de cada sentido, levando a uma vida balanceada. Mas quem quer uma vida balanceada sem dar uns pulos ao bosque para caçar borboletas nunca antes imaginadas?

Em alemão, o frio na barriga da paixão chama-se “borboletas na barriga”. As borboletas magicamente batem asas dentro de nosso estômago, que via de regra nos comunica apenas fome ou indigestão. Nosso corpo contraria qualquer tentativa de manter uma vida estável: além de suas necessidades básicas, faz pulsar o coração de excitamento ou o aperta de decepção; faz a pele se arrepiar de comoção ou ter calafrios de medo. O corpo faz nossa voz tremer de nervosismo e suspirar de contentamento. Nos causa prazer e satisfação com o sabor de uma boa feijoada, ou enjoo quando estragada. Nos esquenta e acalenta quando acolhidos, nos esfria e resfria quando desamparados. Chorei e sorri muito até entender que o sentido da vida não está só lá no bosque nem é apenas um:

Nosso corpo contém os cinco sentidos da vida.

A arte de explorar ao máximo cada sentido transforma a visão em pintura, o paladar em gastronomia, a audição em música, o olfato em perfumes e o tato em dança e escultura. Mas também a inabilidade de os explorar nos torna cegos, surdos, mudos, insossos, frios e distantes. A insensibilidade nos enclausura, nos fecha para a beleza do bosque. O mundo conversa com o nosso corpo enquanto nós o ignoramos com nossos fones de ouvido. As borboletas brilham em furta-cor, mas nosso olhar foi furtado pelo smartphone. As flores exalam fragrâncias que as paredes de nosso apartamento nos desabilitaram a reconhecer. Não se percebe a sutil doçura da água do rio, afinal os refrigerantes têm muito mais açúcar. E o tato?

A pele é o maior órgão do corpo humano. É nossa interface com o mundo gritando lá fora. Até algum arranhão, não nos damos conta de que nossa pele é constantemente estimulada por tudo o que nos circunda: nesse exato momento toco as teclas do computador, enquanto o frio nos meus pés e orelhas vai aumentando. Apesar das janelas semi-fechadas, é como se houvesse uma brisa ininterrupta entre minhas quatro paredes. O ar entra frio pelas minhas narinas, enche meu peito, e sai aquecido pelo calor do meu corpo. E com ele o canto dos pássaros e o chiado da chuva invadindo pela fresta aberta – enquanto tento ignorar o barulho dos carros passando no asfalto molhado.

O tato possibilita nosso primeiro com-tato com o mundo. Pessoas sem-tato não sabem se relacionar. Quando tristes, frustrados, inseguros, nos esquivamos; os ombros tornam para dentro como se quisessem fechar o corpo, a pele, para o com-tato. Na hora do abraço, envolvemos o outro formalmente, de peito fechado, braços pênseis e imóveis como se tivéssemos desligado a pele, sua capacidade de tocar e de ser tocada pelo outro. O toque intimida ao desvelar nossa intimidade com o mundo. Nos sentimos nus, deparando-nos com nossa vulnerabilidade e necessidade de envolvimento.

Podemos contemplar imagens como meros espectadores, escutar música ou amigos como meros ouvintes, cheirar nossos próprios perfumes e almoçar sozinhos. Mas o tato ensina que não há como sentir o prazer do toque sem tocar e ao mesmo tempo ser tocado; que meu sentimento é pessoal, mas nutrido pelas borboletas voando lá fora. Ensina que sentir é a capacidade mágica de se abrir e tocar-trocar com o mundo. Os cinco sentidos revelam nossa sensibilidade: nossa capacidade e necessidade de nos envolvermos com o outro, de abraçar o mundo, nossos próprios sentidos, e todos os sentidos da vida.

 

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