Verão em Berlim

 In essays, sociedade

O dia 21 de junho, solstício de verão no hemisfério norte, marca o ápice não apenas do sol no céu, mas do ano em Berlim. Seus três meses de verão começam oficialmente, e com eles alguns fatos e hábitos que, para brasileiros abençoados pela presença constante de sol e calor, soam curiosos.

O solstício de verão é tão marcante por ser o dia mais longo do ano, no qual a estrela-mor ilumina os berlinenses desde às 3 da manhã até às 11 da noite. É tão marcante por se contrapor como uma conquista inabalável perante o solstício de inverno seis meses antes. No dia 22 de dezembro, só se vê a luz do dia entre 8 e 16 horas. Atenção! Só se vê luz do d-i-a; a luz do sol já não se via desde o verão, pois nessa metade do ano o céu mantém-se nublado. Os habitantes da capital alemã podem ter a sorte de apreciar a luz cinza da cidade sentados no metrô no caminho de ida ao trabalho ou pela janela do escritório. Durante as horas livres, só lhes restam postes de luz, luminárias de bares, letreiros publicitários e lâmpadas neon.

O sol se distanciou, levando sua luz e seu calor. E o humor dos Berlinenses. A distância entre as pessoas é aguçada pelo frio, por três camadas de roupa, pela impossibilidade de permanecer na rua. O atraso de dois minutos do ônibus não é mera falha de infraestrutura; abaixo de 10 graus negativos, pode gelar os pés e queimar a pele do nariz. Museus com seus aquecedores tornam-se parques em estufa. Livros, filosofia, arte, são a única chance de ver e imaginar o mundo para além de quatro paredes aquecidas. O Festival de cinema de Berlim acontece em fevereiro, no fim do período mais frio da Alemanha, quando todas as esperanças já congelaram.

Em março, o sol começa a dar as caras trazendo temperaturas positivas, folhas nas árvores e rostos receptivos. Escutam-se os primeiros passarinhos e murmúrios; os Berlinenses passam a abrir suas janelas e a transitar nas ruas com menos angústia de congelar o corpo e a alma. Bolsas esvaziam-se de gorros, luvas e cachecóis. A cada novo dia, dois minutos a mais de luz e dois milímetros a mais de sorriso. Ainda é frio, ainda nubla, ainda chove, mas o sol e o calor se aproximam mais e mais.

Abril chega com a primavera; flores brotam; bebês e filhotes de cachorro repentinamente tomam os parques como se o inverno tivesse sido o período fértil das espécies humana e canina. Uma comida tão insossa como aspargos torna-se uma delicatéssen gastronômica pelo simples fato de representar o primeiro vegetal fresco do ano. Maio vem com amoras e amores, além dos primeiros morangos colhidos na região. As piscinas externas são abertas ao público, que as frequenta a partir de junho. À primeira temperatura acima de 20 graus já se sabe o que encontrar sobre qualquer gramado: peles brancas desnudas, sedentas pelo sol. Espreguiçadeiras e esteiras viradas para o rio, como se estiradas à beira-mar.

Berlim não tem mar, mas diversos lagos e piscinas que ficam cheios nos dias de verão entre junho e agosto. Pois é, o verão começa oficialmente em 21 de junho, mas não dura três meses, terminando com alguma sorte em começo de setembro. Em termos brasileiros, o verão de Berlim dura na verdade cinco dias não consecutivos. Cinco dias em que é possível entrar na água a temperaturas acima de 28 graus, espalhados aleatoriamente pelo período oficial de verão. Este ano já agraciou a cidade com dois.

Cada um dos cinco dias de verão é uma benção e uma catarse. Afinal, sua ansiosa espera dura 360 dias. O verão em Berlim é uma grande celebração do não-inverno. Radiante, é sempre acompanhado pela inevitável lembrança de que os Berlinenses muito em breve verão o inverno voltar.

 

 

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